Fernanda Goulart – Livro Guia Morador Belo Horizonte
No dicionário, gradear é fechar, mas é também ornar com grades. As grades ornamentais protegem graciosamente. Acrescentam uma camada transparente à arquitetura, que envolve deixando ver, camada gráfica que vibra em linhas de ferro cuja expressividade vai além do que a aparente severidade do material parece permitir. Uma sobreposição também de tempos – os mesmos modelos de grades em edifícios de idades distintas – e de modos de viver e habitar. Oferta de combinações inusitadas entre arquiteturas e ferros rendados, entre formas e escolhas.
Há quem diga que as grades ornamentadas de Belo Horizonte não possuem a exuberância de outras. A diversidade e abundância de seu conjunto, no entanto, nos obriga a duvidar de qualquer argumento simplificador. Com sua presença ubíqua e discreta, elas desenham o espaço presente e nos ensinam sobre um tempo passado, preenchendo a cidade de hoje com linhas voluptuosas ou mais sóbrias, conferindo graça discreta aos caminhos, em distinto tom dos muros de vidro Blindex e dos arames cortantes e encaracolados.
Belo Horizonte tem sua história atravessada por fases sucessivas de demolições, descaracterizações e impermanências. Nasceu sobre os escombros do Curral d’El Rey, e isso poderia ser apenas um fato coerente à cidade planejada, ao qual deveríamos nos conformar com naturalidade, não fosse o ininterrupto processo de destruição de uma memória que vem sendo apagada a passos largos pelo desapegado avanço da “indústria” imobiliária e pela voracidade engenheira. Quanto às grades, estão instaladas em casas que, em sua grande maioria, não são tombadas, e têm sido destruídas em consequência do acelerado processo de verticalização da cidade.
E se olhássemos para essas estruturas como uma espécie de selo, atestando a existência e resistência do que está por trás delas?