Documentário Arquitetônico e a Gráfica da Escola de Arquitetura: Visite a exposição e ganhe um livro histórico

Talvez você não saiba, mas a Escola de Arquitetura, Urbanismo e Design da UFMG já abrigou uma das mais importantes gráficas do país! No post sobre Sylvio de Vasconcellos, conhecemos o riquíssimo acervo de fotos antigas do Laboratório de Fotodocumentação Sylvio de Vasconcellos (LAFODOC). Neste post, descobriremos como a história da Gráfica se entrelaça à história dos livros de Arquitetura e Urbanismo no Brasil. Vamos folhear estas páginas?

A importância da Gráfica da Escola de Arquitetura

Não se sabe ao certo o ano exato de abertura da Gráfica, mas os relatos apontam 1955 como o ano em que os equipamentos necessários para seu funcionamento aportaram na Escola de Arquitetura. Iniciou-se, ainda que de forma precária, aquela que se tornaria uma gráfica de referência para Arquitetos e Urbanistas em nosso país.

Aníbal Mattos, então Diretor da Escola de Arquitetura, informou em seu relatório de 1954 que não havia uma imprensa universitária estruturada na instituição. Explicou, ainda, que existia na Escola de Arquitetura “uma pequena máquina para esse fim” (MATTOS, 1954, p.16). No mesmo relatório, solicitou a compra de uma máquina “MULTILITH”, disponibilizando a máquina existente numa possível troca na aquisição da nova.

Nesse relatório, Aníbal Mattos mencionou a construção das instalações de um “pavilhão para o Laboratório Cine-fotográfico”, o embrião daquele que se tornaria posteriormente o Laboratório de Fotodocumentação Sylvio de Vasconcellos (LAFODOC).

Trabalho em equipe

Não podemos falar da Gráfica de maneira isolada, pois o setor funcionou em parceria com o LAFODOC e com a Seção de Pesquisas da Escola de Arquitetura. Esta última, fundada em 1959 sob a supervisão de Sylvio de Vasconcellos, foi posteriormente renomeada como Instituto Superior de Pesquisas para o Planejamento (ISPPLA), em 1963. Passou a ser chefiado, na ocasião, pela professora Suzy Pimenta de Mello.

Prof. Suzy de Mello, em concurso para catedrático. Fonte: LAFODOC, 1960.

A gráfica era, neste sentido, uma importante extensão do ISPPLA, cujo principal objetivo era a produção de materiais didáticos, científicos e documentais. As tecnologias utilizadas no período eram rudimentares se comparadas com as que dispomos hoje. Mesmo assim, a produção da Gráfica foi intensa e de alta qualidade.

Uma produção de relevância internacional

O ISPPLA publicou inúmeros materiais didáticos, que serviam de apoio para as disciplinas e que alcançaram reconhecimento internacional. Naquela época, a bibliografia específica da área de Arquitetura e Urbanismo era escassa no país e as edições em língua estrangeira eram muito caras.

Sempre trabalhando de forma coordenada (setores de Pesquisa, LAFODOC e Gráfica), foram publicados vários livros nesses primeiros anos, dentre estes dois trabalhos de Sylvio de Vasconcellos: “Arquitetura no Brasil: Sistemas construtivos” e “Arquitetura no Brasil: Pintura mineira e outros temas”.

Saíram do forno, também, os dois primeiros volumes da obra de João Boltshauser, “Noções de evolução urbana nas Américas”. Desse mesmo autor, merece destaque a coleção História da Arquitetura, composta por dez volumes. Esta coleção ainda era uma referência importante para os alunos de Arquitetura e Urbanismo até poucas décadas atrás, quando se popularizou a Internet e se ampliou a produção de livros didáticos e/ou traduzidos no Brasil.

Em seguida, foram publicadas as séries de caráter técnico sobre Sistemas Estruturais e Resistência dos Materiais, bem como a série Documentário Arquitetônico, como veremos mais adiante.

Nas Traduções Escolhidas, os textos eram traduzidos de revistas e demais publicações estrangeiras, tais como:

  • A pintura moderna: 1905-1940 (Luce Hoctin)
  • Evolução e tendências da pintura depois de 1944 (Françoise Choay)
  • A evolução do Arranha-Céu (Guy Habasque)
  • 1930-1960: Trinta anos de arquitetura (Jurgen Joedicke)

A Gráfica também imprimiu o Boletim Informativo da Seção de Pesquisa, que enumerava os novos periódicos disponíveis, contando com 39 números de setembro de 1960 a fevereiro de 1964.

Uma curiosidade… A publicação “Capela de Nossa Senhora do Ó” (1964), de Sylvio de Vasconcellos, hoje é considerada preciosa e está catalogada na seção de livros raros da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos.

Clique na imagem para ver o livro na Biblioteca do Congresso dos EUA.

Entre 1960 e o início de 1964, foram editados 67 títulos, ou seja, quase dois livros por mês. Havia grande incentivo, especialmente por parte do professor Sylvio de Vasconcellos, em publicar a produção dos trabalhos da Escola, incluindo teses de professores e alunos.

Infraestrutura da Gráfica e do LAFODOC

A Gráfica habitava o quarto andar da Escola de Arquitetura, em salas separadas por atividades, como redação e layout. Primeiro, vinha o espaço de datilografia, depois a impressão sobre placa metalizada e, por fim, a impressão sobre papel.

Alguns dos equipamentos utilizados na época ainda podem ser encontrados na Escola de Arquitetura, como a máquina fotográfica de grandes dimensões, que ocupa quase um cômodo inteiro e servia para registrar plantas e outros documentos de maior porte. Este equipamento pode ser visitado no LAFODOC:

Imagens atuais dos equipamentos fotográficos antigos do LAFODOC.

O layout das capas e folhas de rosto eram feitos pelos próprios pesquisadores, que também escreviam, ilustravam e revisavam todo o material. Tratava-se, não raro, de um trabalho artesanal, recortando e colando letras, adicionando cores, fotos ou figuras, bem como desenhando as ilustrações adicionais aos textos.

Documentário Arquitetônico: Uma publicação emblemática

Dentre as publicações da Gráfica, merecem destaque os seis volumes da série Documentário Arquitetônico.

A série tinha por objetivo servir de apoio didático às aulas na Escola de Arquitetura. Utilizou, para tanto, o acervo fotográfico do LAFODOC, com as seguintes curadorias:

1. Alpendres (1960), autores: Celso de Vasconcellos Pinheiro; Gui Tarcísio Mazzoni e Marcos de Carvalho Mazzoni, estes dois últimos os fotógrafos do LAFODOC. Retrata aspectos e detalhes da arquitetura nacional e confere apoio às exposições da Escola de Arquitetura, por meio de nomenclatura técnica dos elementos retratados.

2. Pavimentação (1960), autora: Marina Ewelin Wasner. A publicação mostra pisos diversos, inclusive decorativos, abrangendo formas e motivos variados.

3. Favelas (1961), autores: Gui Tarcísio Mazzoni e Marcos de Carvalho Mazzoni. Procura registrar soluções construtivas utilizadas nas favelas da época.

Veja imagens abaixo da favela Pindura Saia (Fonte: LAFODOC, 1960), que ficava em plena Avenida Afonso Pena, a avenida mais importante da capital mineira. Localizava-se entre a Praça Milton Campos e a Praça da Bandeira, na extremidade externa da avenida do Contorno, que abriga a cidade planejada:

4. Forros (1961), autores: Jessé Guimarães Brito e Armando Oliveira Strambi. Apresenta forros das cidades do ciclo do ouro em Minas Gerais e da cidade de Belo Horizonte, abrangendo o período de sua construção até o início do século XX.

5. Primeiras Casas (1961), autor: Maurício Moura. Registro das casas remanescentes nos primeiros anos de fundação da capital mineira, Belo Horizonte.

6. Fazendas Mineiras (1969), autor: Ivo Porto de Menezes. Registro de três sedes de fazendas em Minas Gerais.

A importância dessa série se modificou ao longo do tempo, mas não se perdeu em momento algum. Para os estudantes da época, consistiam em referências da arquitetura do período, trazendo a prática para a realidade acadêmica. Para os pesquisadores e estudantes de hoje, revelam o retrato congelado de um tempo ido, camadas que tantas vezes não mais existem, neste palimpsesto urbano das nossas cidades.

O golpe militar e o fechamento da Gráfica: o fim de um sonho?

 Em 1964, o ISPPLA e o LAFODOC foram fechados, após o golpe militar que atingiu a universidade e provocou, ainda, o afastamento de estudante e docentes.

Há quem conte uma outra versão para esta história. Segundo o professor Celso de Vasconcellos Pinheiro, a gráfica teria sido fechada por causa da centralização dos processos, que seriam realizados por uma gráfica central na universidade. O professor afirma que tentou reativar a gráfica posteriormente, mas não foi possível por causa das questões de manutenção.

Não obstante as versões obtidas pela história oral, a gráfica permanece até hoje como símbolo da resistência à ditadura militar, tendo em vista que um dos seus principais atores – o professor Sylvio de Vasconcellos – foi afastado de suas atividades acadêmicas dois anos após o golpe (1966), tendo seus direitos cassados, seguido de seu exílio nos Estados Unidos.

As histórias sobre o fechamento da Gráfica atravessaram o tempo, entremeadas de alegrias e lágrimas, mas, acima de tudo, deixando para o presente seus livros: este inigualável legado.

Documentário Arquitetônico na Cidade Palimpséstica: visite a exposição e ganhe um livro original da Gráfica!

Se você se encantou com a história do LAFODOC, da Gráfica e da série Documentário Arquitetônico, não pode perder a exposição Cidade Palimpséstica, com mais de cem fotografias de Belo Horizonte. A série Documentário Arquitetônico foi importante referência para os alunos do curso de Museologia da UFMG, especialmente em seu processo de pesquisa e curadoria da Cidade Palimpséstica.

Nesta exposição, algumas das preciosas imagens deixaram as páginas dos livros e ganharam os espaços da Escola de Arquitetura, Urbanismo e Design da UFMG. É uma exposição belíssima e gratuita.

E como presente você ainda pode ganhar um livro original da Gráfica da Escola de Arquitetura! A Biblioteca Raffaello Berti da EAD/UFMG, que está completando 70 anos, disponibilizou para doação alguns exemplares de títulos icônicos produzidos pela Gráfica, tais como História da Arquitetura, Escultura Ornamental Barroca, Noções de Evolução Urbana nas Américas, dentre outros.

Visite a exposição na Escola de Arquitetura, folheie a série Documentário Arquitetônico na biblioteca e leve com você um livro raro, um pedaço da história da escrita e da produção editorial brasileira.

Não perca: Última semana para visitar a exposição Cidade Palimpséstica. Clique aqui e saiba mais informações!

Texto desenvolvido pelas alunas Ana Cristina Pereira Coelho Matias, Júnia Mara Alves de Souza e Paula Cury Bragança de Matos, na disciplina optativa “Textos de Exposições e Museus: Impressões em papel, tecnologias digitais e web writing” do curso de Museologia da UFMG, sob orientação da professora Ana Cecília Rocha Veiga.

Referências

MATTOS, Aníbal. Atividades da Escola de Arquitetura: relatório apresentado pelo diretor de 1954. Belo Horizonte: Serviço Gráfico da Escola de Arquitetura, 1955. Coleção Mario Berti.

OLIVEIRA, Cléo Alves Pinto de; MACHADO, Marian Ewelin Wasner (org). Uma escola moderna. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. 1 DVD: Coleção Arquitetura & Cidade.

OLIVEIRA, Cléo Alves Pinto; PERPÉTUO, Maini de Oliveira. Arquitetura numa cidade moderna: ensino e produção (1930/1964) volumes 1, 2 e 3. Belo Horizonte: UFMG, 2004.

PINHEIRO, Celso de Vasconcellos; MAZZONI, Gui Tarcisio; MAZZONI, Marcos de Carvalho. Alpendres. Belo Horizonte: Serviço Gráfico da Escola de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais, 1960. 1v. (Série Documentário Arquitetônico; v.1).

SILVA, Dora Aparecida. Imagens do Moderno: Tratamento arquivístico no contexto do mundo digital. Belo Horizonte: Escola da Ciência da Informação, 2006.

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